A Complexidade

É algo ingénuo e puramente simplista pensar que estamos diante de um objeto que é apenas sangue, sexo e violência. A série é, de facto, totalmente explícita a esses níveis, tem um tom carnal e real mas a narrativa no seu cerne descreve um jogo politico, militar e profundamente sentimental disputado entre famílias que desejam o controlo do poder. As emoções são exacerbadas, está em jogo a sobrevivência e o legado destas famílias e dos seus pares, esta criação não é um típico drama medieval. Os personagens secundários, que surgem como cogumelos, possuem caracterizações tridimensionais. Uns por via da obra original e outros por destacarem-se perante a câmara vêm os seus desempenhos crescerem e distanciarem-se da fonte de inspiração. Os personagens são figuras que se preocupam com os seus, lutam e amam numa colisão de moralidade, tradição e a defesa das suas terras. A moralidade destes personagens é uma zona cinzenta onde os heróis têm falhas e os vilões são capazes de atos de compaixão. A nível emocional a série não está distante de emoções que são perfeitamente identificáveis.

O Talento

A nível de intérpretes encontramos um polo de talento que certamente se irá difundir no futuro por outras produções televisivas. Mérito para Nina Gold (responsável pelo casting) que reuniu um respeitável conjunto de atores. Encontramos muitos e bons atores, alguns acabados de sair das escolas de representação britânica, e têm imensa margem de progressão veja-se Maisie Williams (Arya), Emilia Clarke (Daenerys) e Jack Gleeson (Joffrey). Também temos atores mais experientes, são os pilares da série, para referir alguns, Sean Bean (Eddard), Lena Headey (Cersei), Aidan Gillen (Littlefinger) e Peter Dinklage (Tyrion).

A Produção

O departamento de arte fez um trabalho incrível e o detalhe em redor dos personagens atinge níveis impensáveis para uma série televisiva. A primeira temporada desenrola-se em cinco localizações principais que se multiplicam numa multitude de pequenos cenários. A paleta de cores e relevo é impressionante (desertos áridos e gélidos, montanhas e planícies), os cenários estão ao nível do melhor que se fez em fantasia épica na linha de O Senhor dos Anéis. O realismo não passou apenas pelo ecleticismo do guarda-roupa e a dimensão dos sets. Os criadores chegaram ao ponto de desenvolverem uma língua original para um grupo de personagens da série (os Dothraki, uma tribo nomádica). O orçamento apesar de ser astronómico não era ilimitado, a série é dispendiosa, e daí os dez episódios. Várias sequências de guerra (e não só) desaparecem ou são reduzidas num claro investimento nos personagens como sendo força matriz de A Guerra dos Tronos secundarizando o lado mais bélico e massivo da obra. Uma nota sobre a pequena obra-arte que podemos encontrar no belíssimo genérico da série, é espantoso pela sua beleza e utilidade ao localizar-nos na geografia deste mundo complexo.

A Adaptação

Além do elenco e da produção, o sucesso advém primordialmente da majestosa adaptação de David Benioff e D.B. Weiss e da estreita colaboração com George R.R. Martin. O autor criou um universo fantástico e não fica a dever nada a outros grandes mestres do género. Quando comparado com J.R.R. Tolkien poderíamos afirmar que George R.R. Martin é mais elaborado no desenvolvimento emocional dos personagens e explora realmente todas as sensações humanas. O aspeto principal é o poder e a dimensão que confere às personagens femininas que não são apenas “assistentes de bordo”, são as personagens mais fortes da série. As consequências de seguir ritmos humanos que não são produzidos de forma linear resultam num constante clima de imprevisibilidade onde tudo pode suceder.Todos estes aspetos formam um conjunto de mecanismos que fixam a imaginação numa série que não é apenas sobre monstros mas sim sobre a humanidade e as suas emoções, é um momento singular da história da Televisão.

A Qualidade, os Direitos e o Casting

Os atores, o criador e os argumentistas comungam numa série que agrada aos fãs de fantasia e aos apreciadores das produções de qualidade HBO. George R.R. Martin teve receios de vender os direitos do livro até ter descoberto o meio perfeito para não adulterar a sua saga. Nina Gold (diretora do casting) encontrou o tom certo na escolha dos atores, especialmente no caso dos miúdos. Maisie Williams (Arya Stark) relata o percurso e a evolução dos personagens.

Malta e Irlanda do Norte

As filmagens realizaram-se em Belfast, uma localização central que estava próximo de montanhas, planícies verdejantes e perto de uma interessante zona costeira. Ramin Djawadi, o responsável pela composição sonora, abordou a orquestração de um mundo complexo com a utilização de velhos instrumentos, o violino, o violoncelo e sons mais modernos com o sintetizador.

O Design de Produção

A produção evitou seguir o visual medieval britânico criando uma imagem distinta para cada mundo quer a nível de materiais (metais versus as madeiras) e a nível de figurino.

Um Genérico de Sonho

A ideia inicial partiu da necessidade de ter um mapa para orientar as pessoas para Westeros e Essos. O diretor de arte Rob Feng explica o conceito das famílias, as casas, as bandeiras e os edifícios que estão na base do mapa. Este foi elaborado a partir da arte conceptual e referências visuais da série enviadas pelos produtores e as localizações mecânicas são inspiradas nos trabalhos de Leonardo DaVinci. Fica a promessa que o mapa vai continuar a evoluir com a progressão da série.

Do Livro para o Ecrã

A série está próxima da fonte original, é rica em personagens daí a passagem para televisão ter retirado os receios do autor na “mutilação” das suas criações. George R.R. Martin afirma que sempre achou ser impossível adaptar os livros ao grande ecrã e que caminhou num dos seus sonhos quando visitou a produção pela primeira vez. A adaptação foi um desafio para os argumentistas e Martin tem sido parte integral da produção.

A Linguagem Dothraki

Os produtores contratam a Language Creation Society para inventar a linguagem Dothraki. O responsável por este processo foi David J. Peterson, criou uma linguagem gutural com 2000 palavras ao inspirar-se nas práticas de guerra desta tribo de nómadas. Os argumentos chegavam até ele e eram traduzidos para dothraki e eram enviados para aos atores com uma transcrição fonética. Um processo que conferiu autenticidade à série.