O "Concerto" criado por Tiago Cadete “revela a voz de migrantes de países latino-americanos que vivem em Portugal e em Espanha”, numa performance que "inverte aquilo que normalmente se passa numa sala de teatro”, disse o artista à agência Lusa, explicando que “a plateia estará vazia e o público sentado no palco”.

A plateia, “aparentemente vazia, estará, no entanto, cheia de vozes”, difundidas por 20 colunas de som das quais sairão as histórias dos migrantes, contadas em português do Brasil e em “bom portunhol” (como popularmente se designa a mistura de português e castelhano), explica Tiago Cadete.

O projeto - um 'concerto de vozes', portanto - pretende dar voz aos que deixam os seus lugares de origem e “são pouco ouvidos” nos países que os acolhem.

Desenvolve-se assim em conversas soltas, desfiando as “dificuldades que quase todos sentem: não conseguem visto porque não têm trabalho, ou não conseguem trabalho porque não tem visto; as dificuldades da língua, as questões da habitação, a falta de acesso a sistemas de saúde”, exemplifica o artista.

No processo, “as vozes sem rosto” que saem das colunas, “quase que se materializam em rostos concretos para o ouvinte”, ou seja, o público que sentado no palco há-se escutar histórias “de como a precariedade gera violência, de uma mulher agredida pelo companheiro, que a chegou a tentar envenenar, e que levou anos para se libertar”. Ou, conta ainda Tiago, “a de um migrante LGBT, filho de um pastor de um igreja na América Latina, teve que ir para Espanha para se poder assumir”.

Ou a de tantas outras violências que “mostram que são muitos os motivos que levam as pessoas a migrar, e não apenas a questão do dinheiro”.

Quem são estes novos migrantes? E que desejos têm quando migram para o país que os colonizou?

Estas são as questões a que Tiago Cadete procurou responder, através dos relatos dos protagonistas da peça, que espelham a realidade de migrantes a residir em Pombal, Alcobaça e Leira, no caso de Portugal, e de Granollers, na Catalunha, no caso de Espanha.

Intitulada “Concerto”, a performance que não tem música, faz-se de vozes gravadas durante dois meses, ouvidas pelo artista durante outros dois meses, em que cortou e misturou sons a diferentes amplitudes, e da leitura de um "Manifesto do Migrante", dito a 20 vozes por todos os migrantes participantes.

O projeto é o resultado de quatro residências artísticas, em Portugal e na Catalunha, onde Tiago Cadete conheceu os protagonistas e recolheu as suas histórias de migração, num processo ao abrigo do projeto Stronger Periférica Stern Colito, num desafio lançado em Portugal pela Artemede (coprodutor do espetáculo).

“A composição sonora com as vozes dos que, invisíveis, usualmente não são escutados”, a que Tiago Cadete chama “concerto fantasmagórico de vozes”, tem ainda a particularidade de “todos os envolvidos terem sido migrantes”, desde o artista que esteve uma década emigrado no Brasil, ao responsável pelos desenho de som, que trocou o Chile por Portugal, à produtora Ana Lobato, que também viveu no Brasil.

“Concerto” tem estreia nacional agendada para o dia 5 de maio, no Cine-Teatro de Alcobaça e será apresentado depois, a 12 e 13 de maio, no TAG - Llevant Teatre, em Granollers, na Catalunha.

Falado em português do Brasil e em castelhano, com as 'nuances' dos diversos países de origem dos migrantes, o espetáculo contará com uma tradução integral de todos os depoimentos, em quatros línguas, que será distribuída ao público no final da 'performance'.