Apesar do curto papel como Xenophilius Lovegood em
«Harry Potter e os Talismãs da Morte - Parte 1», o galês
Rhys Ifans tem em
«O Fantástico Homem-Aranha» o seu primeiro papel de relevo numa super-produção cheia de efeitos visuais. O filme, realizado por
Marc Webb, regressa às origens do jovem Peter Parker mas promete fazê-lo de forma bem diferente da versão de
Sam Raimi com
Tobey Maguire, que estreou há 10 anos.

Rhys Ifans interpreta aqui o Dr. Curt Connors, um cientista especializado em répteis que procura recuperar o braço que lhe foi amputado estudando a genética das criaturas restejantes. Quanto tudo parece falhar, ele efectua um teste em si próprio, que o transformará no vilão Lagarto, uma criatura reptilária, gigantesca e descontrolada.

A escolha para o papel

«Não foi propriamente um convite, eu fui a uma audição com o [realizador]
Marc Webb e os produtores, e fiquei com o papel. O discurso que eu tinha de ler era muito difícil mas era extraordinário, para mim é a deixa central da personagem. Nesses dois minutos estava todo o peso de um homem que teve um braço amputado durante a maioria da sua vida, que está carregado de culpas e obsessões, que é muito inteligente, e que está no limiar de uma descoberta científica que lhe vai devolver o braço, e portanto que lhe vai devolver o amor próprio, a auto-estima e a família. E ainda por cima, vai poder ajudar a humanidade. Só que este homem foi longe demais e tornou-se um réptil de quase três metros, todo-poderoso, belo, confiante e forte, que consegue fazer tudo o que quer por um breve instante, e que logo a seguir perde tudo isso e regressa ao seu mundo pequeno e cinzento. Essa ascensão e queda, no espaço de um discurso de dois minutos, é algo de muito belo. E é isso que torna a personagem shakespeareana, é isso que a torna épica, ter tudo por um segundo e perder tudo logo a seguir».

Um vilão diferente dos outros

«O Lagarto não é propriamente um vilão, ele é mais complexo que isso. Ele é um cientista que procura fazer o bem só que perde o controlo, é um homem bom a quem as coisas correm mal. Há muitos vilões que começam assim, como alguém que tem o sonho de mudar o mundo, que quer fazer o bem só que é desastrado, imprudente e irresponsável. Foi interessante ver como essa paixão pela ciência e a necessidade de fazer o bem se transformavam em raiva naquela personagem. E há algo de trágico no Lagarto, há uma correlação emocional entre ele e o Peter Parker, eles estão ambos perdidos e nenhum se sente completo. Há algo de comovente em olhar para aquelas duas almas em busca da mesma coisa e depois a tornarem-se adversários, há um tema perene ao longo da historia».

Uma nova origem do Homem-Aranha?

«Toda a gente fala disso, mas não percebo bem o problema. Em Londres, há uma versão do «Hamlet» por ano e ninguém se rala, no Homem-Aranha também faz sentido haver uma versão por cada geração. Há toda uma nova geração de jovens e adolescentes com um mundo completamente diferente e que precisa de um novo Homem-Aranha, que é o único super-herói que verdadeiramente os representa, que representa a cultura juvenil. Os outros são milionários que vivem em mansões, não é algo com que eles se possam identificar. Não acho que voltar ao início tenha sido uma ideia mercenária, acho que o mundo está hoje em dia muito mais em fluxo que nos últimos 100 anos e que esta geração preciso de algo ou alguém que reflita isso».

Trabalhar com o ecrã verde

«Confesso que estava à espera que fosse mais infernal do que foi, que cada dia fosse uma tortura e eu fosse sentir claustrofobia. Mas nada disso, foram poucas as vezes em que tive caracterizações pesadas, porque o próprio Lagarto é feito completamente por computador e só há algumas imagens do meu rosto coberto de escamas que foram feitas com caracterização pura e dura. De resto foi mesmo com o fato de licra e o ecrã verde, o que é incrível porque eu olho para a personagem final e fico espantado: «fuck, aquilo sou mesmo eu, eu reconheco-me ali!». Mas o ecrã verde não me assustou porque eu fiz muito teatro e estou habituado a trabalhar sem adereços, usando apenas a imaginação, e aqui é a mesmo coisa. Claro que parecemos uns bonecos dos testes para acidentes de automóveis, mas aquilo é totalmente libertador, ao contrário do que se pensa».

Trabalhar numa super-produção

«Não foi nada como eu pensava, ou então esta super-produção é diferente das outras. O «set» parece muito caseiro, muito doméstico. E nunca tendo feito um filme assim, adorei chegar ao «set» e sentir-me fascinado, como se fosse um miúdo de escola a ver funcionar todos aqueles depertamentos com especializações diferentes. Passava o dia a perguntar «o que é que faz isto?» e «como funciona aquele modelo?». Há ali coisas brilhantes, não se pode olhar para o filme com a ideia de que aquilo é um monstro corporativo sem qualquer dimensão artística. Muito pelo contrário, entramos e aquilo reduz-nos à dimensão de crianças. Adorei a experiência».

A relação com a BD

«Eu não era um fã de banda desenhada quando era miúdo. Eu cresci em Gales e não havia lá «comic books» como os entendemos. Lá, a banda desenhada era uma moeda de troca, ou seja, cinco «comics» do Batman valiam-nos um single dos Sex Pistols ou uma garrafa de cidra. Os «comics» estavam sempre por ali mas ninguém os colecionava propriamente. Estavam sempre lá, na casa dos pai de algum amigo, numa caixa com revistas «soft-cover», como a «Playboy». Mas lembro-me de ter um «comic» que tinha na contracapa uma máscara do Homem-Aranha para recortar, e de querer ter também o fato. E quando participei há uns sete anos numa produção teatral do «Accidental Death of Anarquist», do Dario Fo, em que fazia o papel de Maniac, e há uma cena no início da peça em que ele trepa as paredes de uma esquadra de polícia para provocar distúrbios. E eu combinei com o encenador aparecer aí com um fato do Homem-Aranha, por isso devo dizer que vesti aquele fato muito antes do Andrew Garfield».

O realizador Marc Webb

«Eu já tinha visto o
(500) Dias com Summer, o primeiro filme do Marc Webb, e tinha gostado imenso. Poder-se-ia dizer que ele é uma escolha estranha para este filme, assim como eu sou uma escolha estranha para o Lagerto. Mas eu percebi exatamente o que os produtores estavam a pensar ao contratar o Marc para isto. Ele tem um universo emocional verdadeiro, e provavelmente foi daí que o ultimo filme do Homem-Aranha se desviou e se tornou demasiadamente mais fantástico. Não quero com isto dizer que este é um Homem-Aranha mais negro que os anteriores, embora isso pareça ser algo de que toda a gente espera de nós por alguma razão, mas é sem duvida muito mais complexo emocionalmente, e, como consequência disso, muito mais real. Tudo o que acontece no nosso filme é tangível, a ciência é possível só que ainda não chegámos lá. A interpretação do Andrew Garfield é a de um adolescente a descobrir o seu corpo, é uma alegoria. Acho que a esses níveis, este é um filme muito mais denso».

A herança de Spike

«Sim, ainda hoje, toda a gente me reconhece como o Spike, a personagem que fiz no
«Notting Hill», e um pouco por todo o lado. E geralmente as pessoas ficam bastante surpreendidas por verificarem que eu até sou um pouco mais bem parecido que aquela personagem descabelada».

Não perca até ao final da semana as entrevistas com o realizador Marc Webb, os produtores Avi Arad e Matt Tolmach, e os protagonistas
Emma Stone e
Andrew Garfield.

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