A poucos dias dos Óscares, a indústria do cinema norte-americana procura adotar um tom reflexivo, humilde, após os escândalos que abalaram Hollywood e o lento progresso no debate da diversidade.

Do #OscarsSoWhite [Óscares Tão Brancos], o protesto contra a ausência de nomeados negros na cerimónia de 2016 às denúncias de abuso sexual contra o outrora poderoso produtor Harvey Weinstein, a Academia tem consciência da necessidade de projetar uma imagem mais íntegra e honesta.

A boa notícia é que os espectadores e os anunciantes milionários, que tornam o espetáculo possível, apostam cada vez mais na marca.

"Não há dúvidas de que os Óscares deram completamente uma guinada", disse o especialista em marcas de celebridades Jeetendr Sehdev, autor de um estudo sobre a temporada de prémios de Hollywood.

"É uma conquista espantosa para os realizadores da Academia, não apenas porque a sua marca foi muito desacreditada e rodeada de desconfiança nos últimos anos, mas também pelo ambiente politicamente carregado em Hollywood".

ÓSCARES 2019

  • São oito os títulos na corrida a Melhor Filme: "Roma" e "A Favorita" (dez nomeações), "Assim Nasce Uma Estrela" e "Vice" (oito), "Black Panther" (sete), "BlacKKKlansman: O Infiltrado" (seis), "Bohemian Rhapsody" e "Green Book: Um Guia Para a Vida" (cinco)
  • A 91ª cerimónia realiza-se a 24 de fevereiro no Dolby Theatre de Los Angeles, às 17 horas locais (uma da manhã em Portugal)
  • Pela primeira vez desde 1989, não haverá anfitrião
  • Os Óscares honorários desta edição já foram entregues à atriz Cicely Tyson, aos produtores Kathleen Kennedy e Frank Marshall, ao compositor Lalo Schifrin e o relações públicas Marvin Levy

Sehdev, um académico influente, com mais de um milhão de seguidores nas redes sociais, mantém uma pesquisa desde 2012 na qual solicita, periodicamente, opiniões sobre os ricos e famosos, numa seleção aleatória de dois mil adultos nos EUA.

Na sondagem mais recente, com o título "O poder do Óscar", 71% dos entrevistados afirmaram que confiavam na marca - contra 51% em 2015 - e 75% consideraram o espetáculo "inovador".

Esta última resposta foi obtida apesar do caos na cerimónia do ano passado, justamente no momento de anunciar o vencedor de melhor filme: Warren Beatty e Faye Dunaway receberam o envelope errado entregaram o prémio a "La La Land: Melodia de Amor", quando na verdade o vitorioso era "Moonlight".

Minorias sub-representadas

Para renovar a confiança, a Academia de 8.500 membros iniciou um processo de reformas, depois que, pelo segundo ano consecutivo, em 2016, todos os nomeados nas categorias de interpretação serem brancos, o que gerou pedidos de boicote e indignação nas redes sociais.

Muitos votantes não ativos na indústria - a maioria homens brancos - perderam os privilégios de voto, enquanto a maioria dos 1.500 convidados a entrar para a Academia entre 2016 e 2017 eram mulheres ou negros.

Um estudo da universidade UCLA destaca que os dois grupos estão "consideravelmente sub-representados" em Hollywood.

"Relatórios nesta série demonstram repetidamente que os filmes e séries de televisão com um elenco adaptado à diversidade dos Estados Unidos tendem a registar as maiores bilheteiras e audiências", afirma o documento, baseado na produção de 2016.

Segundo o estudo, as minorias têm 13,9% dos papéis de protagonista no cinema e 18,7% na televisão, com apenas 12,6% na realização de filmes. E aqui, as mulheres dirigem apenas 6,9%.

2,6 milhões de dólares por 30 segundos

A credibilidade dos Óscares é importante porque vencer a estatueta traduz-se em dinheiro, recorda Sehdev, autor do livro "The Kim Kardashian Principle".

Veja a lista completa de vencedores dos Óscares
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"Os vencedores do Óscar terão, inevitavelmente, melhores ofertas de patrocínios, já que as marcas procuram celebridades que possam influenciar a geração 'millennial', a mais multicultural até hoje", recorda.

Oito em cada 10 entrevistados por Sehdev concordaram que os negros eram responsáveis pela perceção de confiança e respeito, enquanto cinco em cada 10 atribuíram às mulheres, o que poderia sugerir que o movimento #MeToo teve menos impacto que o #OscarsSoWhite.

"As mulheres corajosas de Hollywood que revelaram os casos de assédio e abuso sexual, no entanto, são vistas como vitais na mudança de imagem dos Óscares", ressaltou este académico.

Os anunciantes mantêm a aposta na cerimónia de 4 de março, apesar do escândalo Weinstein, da controvérsia #OscarsSoWhite, do "Envelopegate" de "Moonlight" ou, talvez o mais importante, a queda de audiências, que em 2017 foi de 33 milhões de pessoas, a menor em nove anos: o canal ABC vendeu todos os espaços publicitários, supostamente a 2,6 milhões de dólares por 30 segundos.