Situado na costa do Mar Báltico, entre a Polónia e a Lituânia, o enclave russo de Kaliningrado está recheado de fachadas germânicas, ruas estreitas e igrejas.

A região, conquistada pelo Exército Vermelho em 1945, ainda conserva as características arquitetónicas do que era a Prússia Oriental - o suficiente para atrair realizadores e produtores russos para locais que parecem menos soviéticos.

"Filmar em Kaliningrado é muito conveniente. A administração recebe-nos de braços abertos, pagamos tudo em rublos e os figurantes falam russo", disse o produtor moscovita Nikita Sapronov.

Recentemente, ele usou a cidade para a sua série de televisão "GDR" - a abreviatura russa para Alemanha Oriental - que se passa em Berlim na época da queda do Muro no final dos anos 1980.

Era para ser filmado na Alemanha, mas com a intervenção militar em grande escala da Rússia na Ucrânia, “a Europa basicamente fechou a porta na nossa cara”, disse Sapronov à France-Presse.

A sua equipa recorreu a Kaliningrado, recriando este ano uma secção do Muro de Berlim no centro da cidade.

"Kaliningrado substituiu perfeitamente Berlim Oriental e Ocidental", com a sua mistura de edifícios alemães e soviéticos, disse o produtor.

Substituto da Europa

Figurantes na rodagem de um filme russo a 14 de julho de 2023 na cidade de Zheleznodorozhny

A proliferação de rodagens em Kaliningrado demonstra a saúde surpreendente da indústria cinematográfica russa, apesar do seu isolamento da cena cultural internacional e da fuga de uma força de trabalho que teme a mobilização para a guerra na Ucrânia.

As produções locais beneficiaram de generosos subsídios estatais.

Em 2022 foram feitos o dobro de filmes infantis russos do que no ano anterior, de acordo com a publicação da indústria russa Boletim Kinoprokatchika.

Os filmes russos registaram um crescimento de 30% nos serviços de streaming e de 25% na televisão – embora a maioria das produções se destine exclusivamente ao público doméstico.

O governo duplicou o seu apoio à indústria cinematográfica para 14,9 mil milhões de rublos (cerca de 147,2 milhões de euros, ao câmbio do dia) em 2022, parte do plano do presidente russo Vladimir Putin para substituir produtos importados - carros, alimentos e bebidas - por produtos fabricados na Rússia.

É difícil obter números sólidos para o sector, mas o cinema russo parece depender em grande parte deste apoio estatal para se manter de pé.

De acordo com o jornal económico russo RBK, dos 26 filmes financiados no ano passado pelo Fundo do Cinema Russo, apenas um – uma comédia – foi lucrativo.

Kaliningrado beneficiou do 'boom' – fruto de uma estratégia de longo prazo. A região já oferecia subsídios às produções de até 40% nos últimos cinco anos.

Mais recentemente, a cidade de Zheleznodorozhny acolheu, em Julho, uma produção de longa-metragem cuja ação se passa na Europa de Leste.

Hollywood no Báltico

Figurantes na rodagem de um filme russo a 17 de julho de 2023 na cidade de Zheleznodorozhny

“Estes telhados vermelhos, estas estradas pavimentadas ladeadas por árvores no meio de paisagens rurais – é o último pedaço de Europa que nos resta”, disse a designer de produção Yulia Makuchina, dando a entender a sua tristeza.

Durante a Guerra Fria, Kaliningrado já era um local muito querido pelos realizadores que procuravam encenar confrontos entre o Exército Vermelho e as tropas nazis na Europa.

Hoje, o governo regional quer expandir a sua gama de cenários com um programa de renovação massivo.

Desde 2022, Kaliningrado tornou-se “o 'set' europeu definitivo” para os russos, disse o ministro regional da cultura e do turismo, Andrei Yermak.

“Já estamos a receber 10 produções por ano”, deu conta.

Anúncios a oferecer cursos de produção cinematográfica estão por todo o lado em Kaliningrado e um enorme estúdio está em construção, apresentado pela imprensa local como "Hollywood no Mar Báltico".

O enclave enfrenta, no entanto, desafios logísticos significativos, isolado do resto da Rússia e a centenas de quilómetros de Moscovo.

A Lituânia tem limitado o trânsito terrestre de mercadorias, deixando a rota marítima mais cara como alternativa para abastecer a região.

“Felizmente, os portos de Kaliningrado não estão congelados durante o ano todo e os nossos custos de envio são parcialmente reembolsados”, disse o produtor Artiom Sudzhan.