Água, terra, fogo e ar: as personagens de "Elemental", o novo filme da Pixar que chega esta quinta-feira aos cinemas, inserem-se num dos elementos e vivem numa cidade inspirada em Nova Iorque. A história, como habitualmente nos filmes da Pixar, tem várias camadas de leitura e muitos temas no centro: a integração de imigrantes numa cidade nova, as relações interculturais e o sacrifício de uma família.

Priscila Vertamatti trabalhou na animação do filme e esteve à conversa com o SAPO Mag sobre "Elemental" e sobre como é trabalhar na Pixar.

SAPO Mag: A Priscila nasceu em São Paulo, foi estudar para os Estados Unidos e trabalha na Pixar há vários anos - já trabalhou numa série de projetos bem conhecidos do público, como "Coco", "Inside Out - Divertidamente", "Toy Story 4" e uma série de outros. Para um animador, não há muito melhor para ir depois disto...

Priscila Vertamatti: Eu penso nisso também: já estamos está no topo. A Pixar é uma empresa que valoriza muito a família, você pode ter uma empresa em que estabiliza e muitas pessoas ficam contentes só como animadores. Muitos animadores pensam em seguir uma carreira mais de manager, em que podem ser um diretor de animação, um supervisor de animação. E outras pessoas preferem fazer os próprios projetos. No meu caso, eu tenho os meus personagens que faço além da Pixar. As pessoas dizem que sou doida porque animo o dia inteiro, vou para casa e continuo animando.

SAPO Mag: O "Elemental" tem como ponto de partida uma história sobre integração de imigrantes numa cidade que é claramente inspirada em Nova Iorque e aborda também a questão das relações interculturais. Volta a ser aqui uma história cheia de profundidade e com muitas camadas de leitura, como a Pixar nos habituou...

Priscila Vertamatti: Eu identifiquei-me muito com esse filme, na verdade. Queria trabalhar muito no filme porque eu me revi muito na Amber, nessa parte de estar num lugar diferente. Eu, como brasileira, vim para os EUA sozinha, quando era jovem. Acho que muita gente se vai identificar com a parte da imigração. Ficar longe da família é muito difícil. Eu estou aqui há 15 anos, é muito tempo para ficar com a família toda no Brasil. Acabamos a fazer amizades também, conheci um americano, mas mesmo assim é difícil. Mas a Pixar tem pessoas de todo o mundo, por isso, toda a gente tem isso em comum.

SAPO Mag: Em que personagens é que trabalhou no Elemental e que tipo de trabalho de animação fez nessas personagens?

Priscila Vertamatti: Eu trabalhei mais no Clod, que é do elemento terra. Tive alguns shots bem legais com a mãe do Wade, que é do elemento água e alguns shots com a Amber também, foi muito legal.

SAPO Mag: Como é que é um dia típico na Pixar de trabalhar num filme como o "Elemental"? Como é que o processo de trabalho?

Priscila Vertamatti: Trabalhar aqui é um sonho. Num dia típico recebemos "shots", né? Recebemos o layout, que é mais ou menos onde os personagens vão estar, o que eles vão fazer e começamos a fazer a parte que se chama "Blocking". Fazemos o começo da personagem, para ter uma ideia de como o plano vai ser e a partir daí vamos mostrando ao realizador e ele vai dando feedback. Começamos o dia com a reunião de "Dailys": todos os dias, o diretor olha para os shots dos animadores e há um período à tarde, que chamamos de "walkthroughs", em que também mostramos para o diretor e os supervisores. Temos outros meetings com os diretores de animação, qualquer oportunidade para ter feedback. É um processo bem colaborativo.

SAPO Mag: As personagens de "Elemental" não são fotorealistas, não são figuras humanos. É mais fácil ou há uma maior liberdade criativa quando se trabalham personagens como estas que não têm uma correspondência no mundo real?

Priscila Vertamatti: Gosto muito da sua pergunta, porque eu acho que tem, sim. Eu acho que há animadores que preferem animar humanas, mas eu particularmente gosto muito de ter essa liberdade. Principalmente com a Amber, às vezes o rosto se mexe mais, o cabelo fica todo doido. Achei que quando comecei a trabalhar nesse filme ia ser muito difícil de animar, mas acabou por ser muito divertido. Lembrou-me muito quando eu trabalhei no "Divertida-Mente", onde também tivemos muita liberdade de animar os personagens. Para uma animadora é um sonho ter uma personagem assim.

SAPO Mag: O que é que diria que o "Elemental", vai trazer de único, mesmo olhando para a restante filmografia da Pixar?

Priscila Vertamatti: Eu acho que a mensagem mais emotiva do filme é aquela de que o realizador Pete Sohn já falou sobre o sacrifício dos pais. Eu acho que é um tema em que as pessoas não pensam muito, no sacrifício da família, na questão de seguir o caminho da nossa família ou seguir o nosso próprio caminho. Acho que as pessoas vão assistir a este filme achando que é uma história de amor, mas vai surpreender muita gente.