No passado dia 22 de setembro, os canais FOX e FOX Comedy estrearam a série de vídeos curtos "Nuvem". A animação portuguesa foi a primeira de sempre a estrear no Metaverso nacional, no espaço virtual do MEO.

Partindo de uma ideia original do estúdio criativo da The Walt Disney Company Portugal, a série tem argumento de Ana Correia (Peperan), Diogo Lima e Manuel Cardoso e foi produzida pela Playground Production Company e pelo estúdio de animação Dialogue.

"Num vasto cosmos de zeros e uns, a Nuvem é um lugar que promete armazenar e cuidar de avatares digitais com problemas, abandonados pelos seus criadores. Mas o que aparenta ser o paraíso é na verdade o limbo entre a recuperação e a eliminação absoluta... E, acima de tudo, um inferno de tédio", adianta a FOX.

Leia a conversa do SAPO Mag com os argumentistas Ana Correia (Peperan), Diogo Lima e Manuel Cardoso:

SAPO Mag: Qual foi o ponto de partida para a série? Como surgiu a ideia?

Peperan: A FOX enviou-nos uma ideia inicial para uma série que pretendia falar sobre avatares com problemas presos na Nuvem. Quando a ideia passou para mim e para o Diogo e Manuel, foi-nos bastante natural querer criar um mundo maior para estes 6 colegas digitais e dar-lhes personalidades bastante específicas, que sejam um reflexo da internet nos dias de hoje. Ter um boomer, uma influencer, uma gen-z, uma niilista, um hacker e um sticker juntos na mesma sala, que na verdade é um limbo digital, foi a pólvora suficiente para gerar a ideia para a série.

Diogo Lima: Basicamente apropriámo-nos dessa ideia original da The Walt Disney Company e complicámos um bocado aquilo que era para ser. Passámos algum tempo focados nesse “ensemble” para refletir de forma mais diversa todo um leque de arquétipos associados a figuras da era digital contemporânea. Com o tempo, demos por nós a explorar as regras e possibilidades do universo que as personagens habitavam e a coisa acabou por fluir naturalmente para a história da “Nuvem”.

Manuel Cardoso: Sim, a FOX teve uma boa ideia: a série. E depois teve uma má: ligar a cada um de nós. No fundo, fomos contratados para ser a solução e tornámo-nos num problema.

Qual foi o maior desafio de criar as curtas de animação? E como foi o processo criativo?

Peperan: Pessoalmente, o maior desafio foi limitar os episódios à duração de 2 minutos cada. É um pouco complicado, principalmente quando contamos com 6 personagens a quem tentamos dar o mesmo peso ao longo da temporada. Quando dávamos por ela, já íamos com 4 ou 5 páginas de guião.

Fiquei muito feliz por ver que eu, o Diogo e o Manuel encaixámos super bem, apesar de nunca termos trabalhado juntos antes e dos nossos diferentes backgrounds. Diria que o processo criativo foi o normal passar do “macro para o micro” e foi um processo muito sossegado e divertido. Acho que só puxámos uns cabelos no último episódio, mas no fim acabámos todos bem penteadinhos.

Diogo Lima: Na parte da escrita, a infinitude de possibilidades que se abre quando te podes dar ao luxo de criar coisas que numa produção de carne e osso te fariam rebentar o orçamento é contraposta pela dificuldade de encaixar uma narrativa concisa e apelativa numa duração bastante curta. Não te serve de nada ter coisas a explodir ou imaginares mundos e fundos se o espectador não conseguir entender o contexto da história nem criar uma relação com as personagens.

No lado da realização - e é importante ressalvar que tanto eu como a Pep não vimos desse background, pelo que o trabalho do César Furtado e da Dialogue foi fundamental em trazer isto à vida - é fulcral ter noção da complexidade destes processos e estar-se em sintonia com quem vai ilustrar, animar, dar corpo à história. Um pormenor no cenário que não se coadune com as regras do universo que concebeste ou uma expressão na cara duma personagem que não ligue com a intenção do texto original podem atrasar a cadeia de produção de um episódio.

Manuel Cardoso: Da concretização das ideias que escrevemos não posso falar, pois a minha participação no projeto cessou a partir do momento em que premimos o botão de “Enviar” no Gmail. Quanto à conceção dos guiões, julgo que a maior dificuldade foi a de definição do universo. Em animação, tudo é possível. Por outro lado, tudo é muito difícil. Por isso, há que ser, em simultâneo, ambicioso e frugal.

 Como descrevem a história da série e a linha condutora dos episódios?

Peperan: É uma série sobre 6 avatares com problemas, que foram abandonados pelos seus criadores. Após Zoe_19, a última a entrar neste grupo, perceber que não vai ser resgatada, passam os restantes episódios numa fuga pela Nuvem, para tentar encontrar o paraíso no meio daquele inferno.

Diogo Lima: É um bocado por aí - um misto dos elementos comuns a uma sitcom com uma história em registo “Fuga das Galinhas”. A novata Zoe_19 acaba por estabelecer o fio condutor da série no sentido em que é através da sua história e ações que os restantes avatares se dão a conhecer ao espectador.

Manuel Cardoso: São episódios de breves minutos. Se eu acrescento alguma coisa ao que já foi dito, isto torna-se num resumo Europa-América da série e já ninguém se sentirá motivado para ir ver.

Há ideias de dar continuidade ao projeto? Têm planos para novas aventuras?

Peperan: Nim? Ahaha não sei, há sempre conversas sobre possíveis novas temporadas. Se ficarem felizes com esta temporada, tenho a certeza que irão surgir novas aventuras.

Diogo Lima: Quando se criam universos destes há uma quantidade enorme de possibilidades que vêm à cabeça e apetece explorar e desenvolver. Por isso, sim, embora a decisão já não esteja nas nossas mãos. Venho, nesse sentido, apelar aos portugueses que vejam todos os episódios e comentem nas redes sociais dos canais afetos à The Walt Disney Company (mesmo nos do 24Kitchen ou do National Geographic Portugal) a pedir mais uma temporada da série.

Manuel Cardoso: É provável. Mas, quando a questão se colocar, os avatares já terão a capacidade, via inteligência artificial, de escrever as suas próprias falas. Em princípio, nós já não teremos utilidade e seremos, lá está, apagados.