A 77.ª edição do Festival de Cinema de Cannes começa dentro de uma semana com 22 candidatos à Palma de Ouro, incluindo Francis Ford Coppola, homenagens à velha guarda de Hollywood e, nos bastidores, a tensão no cinema francês devido às denúncias de abusos.

Na competição de longas-metragens figura “Grand Tour”, de Miguel Gomes, enquanto “Mau por um momento”, de Daniel Soares, está selecionado para a competição de curtas-metragens.

Ainda em língua portuguesa na disputa da Palma, o Brasil será representado com "Motel Destino", de Karim Ainouz.

O festival tornou-se uma montra de glamour, plataforma de negócios e também palco para todo o tipo de reivindicações, e esta edição de 14 a 25 de maio promete servir o mesmo cocktail.

Um movimento coletivo de trabalhadores do evento, "Sous les écrans, la dèche", convocou uma greve durante o evento para protestar contra as suas condições de trabalho.

O grupo, independente das grandes centrais sindicais francesas, convocou a mobilização após uma reunião na segunda-feira.

O Festival de Cannes, bem como as sessões paralelas, reagiram esta terça-feira com uma proposta de diálogo, após reconhecerem que estão "conscientes das dificuldades sofridas por alguns dos seus trabalhadores que somam diferentes contratos para festivais de cinema".

A megalomania de Coppola

"Megalopolis"

Aos 85 anos, Coppola atrai grande parte das atenções com "Megalopolis", filme protagonizado por Adam Driver, produção na qual investiu boa parte da sua fortuna, assim como fez há 45 anos com o lendário "Apocalypse Now", com o qual venceu a segunda Palma de Ouro (a primeira foi com "O Vigilante", de 1974).

Há muitos outros nomes conhecidos dessa geração que estão fora da competição, como George Miller, que exibe "Furiosa", mais um capítulo da sua saga "Mad Max".

O norte-americano Oliver Stone ("Platoon", "JFK") regressa aos documentários, desta vez com "Lula", obra dedicada ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, alinhado com a sua visão esquerdista da história recente da América Latina.

Kevin Costner também faz o seu regresso com "Horizon: An American Saga" e um dos seus temas preferidos, a conquista do Velho Oeste, que será apresentado fora da competição.

O festival homenageará com Palmas de Ouro honorárias George Lucas ("Star Wars") e a atriz Meryl Streep, que regressará a Cannes após uma longa ausência de mais de três décadas, além do estúdio de animação japonês Ghibli, na primeira vez que o festival concede a honra a um grupo.

Tráfico de drogas e transexualidade

Coppola terá de lidar com uma representação variada do cinema mundial.

O cinema musical é representado pelo francês Jacques Audiard, com "Emilia Perez", uma história de tráfico de drogas e transexualidade ambientada no México.

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Destacam-se também o iraniano Ali Abbasi com "The Apprentice", sobre a juventude de Donald Trump, ou o grego Yorgos Lanthimos, que regressa com "Kinds of Kindness", ao lado da sua atriz favorita do momento, Emma Stone (vencedora do Óscar por "Pobres Criaturas").

Paul Schrader, premiado argumentista de "Taxi Driver", apresentará "Oh Canada", protagonizado por Richard Gere, num reencontro após "American Gigolo" (1980).

Novas estrelas também estarão em alta no evento, como Jacob Elordi, Barry Keoghan, Margaret Qualley e outros.

Novos valores

Do lado ibero-americano, o espanhol Jonás Trueba estreia em Cannes com "Volveréis", dirigido pela sua parceira Itsaso Arana.

Esta comédia concorre na Quinzena dos Realizadores, um dos programas paralelos do festival, ao lado de  "Algo viejo, algo nuevo, algo prestado" do argentino Hernán Rosselli, uma coprodução com Portugal, o documentário "A queda do céu", filmado por Eryk Rocha e Gabriela Carneiro da Cunha na Amazónia, e o chileno "Los Hiperbóreos", de Cristóbal León e Joaquín Cociña.

De  Portugal, estarão a longa-metragem “A Savana e a Montanha”, de Paulo Carneiro, e as curtas-metragens “Quando a terra foge”, de Frederico Lobo, e “O jardim em movimento”, de Inês Lima.

A Semana da Crítica, outro programa, presidida pelo espanhol Rodrigo Sorogoyen ("As Bestas"), recebe a curta-metragem portugusa “As minhas sensações são tudo o que tenho para oferecer”, de Isadora Neves Marques, além de "Simón de la Montaña", do argentino Federico Luis, "Baby", do brasileiro Marcelo Caetano, e numa sessão especial, a curta "Las novias del sur", de Elena López Riera.

Do lado das reivindicações está a questão da presença de Judith Godrèche, que abalou o cinema francês com as suas acusações de violação contra os cineastas Benoît Jacquot e Jacques Doillon que lançaram um movimento semelhante ao #MeToo.

A atriz deverá apresentar "Moi Aussi" ["Eu também"], uma curta-metragem filmado após as suas denúncias.

Apenas 20% da seleção de filmes foi dirigida por mulheres, critica uma associação feminista francesa que luta pela igualdade de género.

Outra questão é se o iraniano Mohammad Rasoulof, cineasta assediado pelo regime, poderá viajar a Cannes para competir pela Palma de Ouro com "The Seed of the Sacred Fig".

O júri deste ano é presidido por Greta Gerwig, a realizadora do sucesso "Barbie", e conta ainda com, entre outros, o realizador espanhol Juan Antonio Bayona ("A Sociedade da Neve") e a atriz indígena americana Lily Gladstone.